As Mulheres no Mercado de Imagem – Entrevista com Aziza Eduarda

No mercado de imagem, as mulheres estão criando novas narrativas. Em um setor predominantemente masculino, elas enfrentam desafios únicos, buscando não apenas se destacar, mas também abrir caminhos para outras mulheres. Para dar foco a essas vozes e trajetórias inspiradoras, a revista FHOX apresenta a série de entrevistas “Cria”.

Hoje, conversamos com Aziza Eduarda, uma mulher negra de 25 anos, natural da região metropolitana de Belo Horizonte-MG. Aziza é uma multiartista que transita com maestria entre a arte visual, a fotografia e o audiovisual. Seus projetos autorais têm conquistado reconhecimento pelo storytelling e pela originalidade de sua abordagem.

Pretos Novos – Aziza Eduarda

Em nossa conversa, Aziza compartilhou um pouco de sua jornada profissional, destacando as técnicas que mais tem explorado e revelando detalhes sobre seu projeto mais recente, “Pretos Novos”.

“Tudo que eu crio, tudo que eu realizo é porque um dia eu enxerguei”  

Aziza Eduarda

F: Como e quando você começou na fotografia?

A: Então, eu sempre tive uma relação de muito afeto com a fotografia porque a minha família sempre guardou, com muito primor, os álbuns de família. Por ser difícil revelar foto, ter essas fotos reveladas, e o quanto isso sempre foi muito importante para todo mundo. Eu acredito que isso aí é um começo da minha relação com a fotografia, mas fotografar mesmo foi na minha pré-adolescência. Eu pegava o celular dos meus pais, na época eu não tinha celular, e aí fotografava paisagem. Até que eu fui entendendo que gostava mais de fotografar pessoas e como eu não tinha pessoas para posar, eu colocava o meu corpo como essa expressão, começando aí a produzir muito autorretrato. Já com os 15 anos, eu comecei a trabalhar como fotógrafa, fazendo ensaios, cobrindo eventos e depois, em 2016, eu encontrei o fotojornalismo.

F: Qual é o estilo fotográfico que você mais trabalha atualmente?

R: Hoje, eu trabalho majoritariamente com a fotografia documental e a minha fotografia ela vai também muito pelo lado da moda, né, então eu produzo muito editorial, né, então além da fotografia eu faço a direção de arte, muitas vezes eu faço figurino, faço cabelo, então tem essa relação também.  E só para complementar, eu falo muito, assim, nesse sentido da fotografia documental, porque um dos meus principais objetivos hoje é a formação de arquivos negros.

Pretos Novos- Criar Futuros por Aziza Eduarda

A artista nos revelou sua preferência pela iluminação natural, utilizando os conhecimentos ancestrais para compreender as nuances das estações do ano e o impacto do sol nas locações. Além disso, seu trabalho possui uma forte influência na moda, explorando cuidadosamente figurinos e cenários, todos concebidos e executados por ela mesma.

F: Conte-nos sobre os projetos “Encruzilhadas” e “Pretos Novos”. Como surgiram e quais foram suas referências?

A: Bom, o “Encruzilhadas” é um projeto que surgiu durante a pandemia e veio também num momento muito sensível para mim, porque eu estava passando por um momento em que as demandas de trabalho estavam muito pequenas. Eu me senti muito questionada sobre o que eu ia fazer com isso, pois, ao mesmo tempo, eu estava cheia de energia e com muita vontade de criar, mas não estava surgindo oportunidades para isso. Então, decidi criar essa oportunidade, criar a partir daquilo que eu tinha, criar a partir das pessoas que estavam ali ao meu redor.

Esse é um projeto que surgiu ali no início da pandemia, em termos de ideia. Executado, foi um pouco mais para frente. É um projeto que fala da relação das pessoas com a espiritualidade, enquanto uma forma de sobrevivência mesmo. Os orixás sempre estiveram muito presentes, mas nesse momento eu acho que foi uma presença um pouco mais forte, até por tudo que a gente estava vivendo, a sensação de medo e no que a gente se apegava no meio do caminho.

É um projeto que eu tenho muito carinho, eu acho muito bonito. Ele acaba misturando outras coisas, como poesias. Foi nele que eu pude experimentar mais o audiovisual. Isso abriu caminho para outros projetos, eu percebi ali que não precisava necessariamente ser contratada ou ter uma determinada grana para realizar aquilo que eu tinha desejo. Eu conseguia realizar a partir dos meus recursos, a partir da minha criatividade, a partir das pessoas que estavam ao meu redor.

E aí o “Encruzilhadas” abriu o caminho, literalmente, para o “Pretos Novos”. Porque eu lembro muito que eu queria finalizar o “Encruzilhadas” com um ensaio para Exu. E aí eu fiquei procurando, procurando, procurando, procurando, procurando. E não dava certo, sabe? Não se encaminhava. Aí eu falei, não, eu acho que tem que finalizar por aqui mesmo. Foi quando eu decidi finalizar, comecei esse outro projeto que é o “Pretos Novos”, porque ali naquele momento me veio muito, né? Muito nesse lugar da morte, da gente estar lutando contra a morte. E não só das memórias antigas, mas das memórias de nós que somos jovens, que estariam sendo perdidas.

E aí o “Pretos Novos” surge desse lugar. Surge com o ensaio “ibeji: a arte engana a morte” muito nessa relação da gente fazer arte para enganar a morte, a nossa sobrevivência é uma sobrevivência artística, acima de tudo. A partir disso, eu encontrei esse ensaio que seria o final de “Encruzilhadas”, que foi o ensaio “Caminhos” com o Ryan, que traz a presença de Exu.

Então, são projetos que estão muito conectados, que trazem muita proximidade, não só porque são pessoas próximas, mas porque são projetos que falam sobre a nossa vida, sobre ser futuros ancestrais. Então, o “Pretos Novos” ainda está em continuidade, não acho que está na hora de acabar, é algo muito maior do que eu imaginei.

Pretos Novos- Ibeji: A arte engana a morte por Aziza Eduarda

F: Um dos diferenciais do seu trabalho é o storytelling, o que veio primeiro na sua vida, a fotografia ou as histórias que você decidiu contar?

R: A com certeza as histórias vieram antes. Assim, a fotografia foi uma forma que eu encontrei de contar essas histórias, assim como encontrei outras formas também, como a pintura, como a palavra. Mas eu acho que, com certeza, as histórias… Eu já disse que eu gosto muito de cinema e eu acho que o que eu faço em termos de fotografia também é muito cinematográfico, nesse sentido da narrativa, da história. Então, eu sempre quis contar algumas histórias. Este projeto que eu faço, que é o “Azul e outras cores escuras”, é um projeto que eu quero realizar desde, sei lá, os meus, 16 anos, sabe, por passar ali na Praça Sete e ver a galera do soul e achar tudo muito massa e achar muito importante que as pessoas sejam reconhecidas. Então, tem histórias que vieram muito antes. Então, eu acho que é uma parte essencial na minha construção.

Azul: e outras cores escuras
Com @walterpinheirodosoul por Aziza Eduarda

F: Para finalizar, queremos saber onde nós encontramos Aziza Eduarda em 2024?

Espero que me encontrem em muitos lugares, sinceramente, me encontrem na correria; isso é um fato, mas também que me encontrem aproveitando e colhendo essas coisas que foram fruto da correria. 2024 é um ano de muita colheita de coisas que plantei em 2023, mas também é um ano de muitas construções, de trazer para este plano coisas que imaginei e sonhei por muito tempo. Então, acho que são esses lugares, né?

Vai me encontrar no audiovisual, vai me encontrar na fotografia, vai me encontrar na pintura, vai me encontrar escrevendo e valorizando cada dia mais esse lugar que a arte me traz de honrar mesmo, de ser ebó de arte, de ser uma entrega para os nossos ancestrais.